sexta-feira, 20 de junho de 2008

Memórias para minha filha...




...para o caso de eu esquecer de contar a ela, o que ela precisa saber sobre minhas irrelevantes primordialidades...



Crônica dos Bebês Gaudérios:

Vão os bebês, distraídos no colo das mães trabalhadoras.
Vão com seus olhinhos de criança, enrolados em mantos, vão para creche de manhã.
Vão aproveitando o calor de suas mães no trajeto até a escolinha.Eles vão, gauchitos, no frio, dentro do cobertorzinho, no colo de mãe.
É bonita a cena. Comove e questiona.
Comove porque te faz pensar que estas mães são trabalhadoras porque almejam algo melhor para si, para suas famílias.
Certamente se pudessem optar entre cuidar de seus filhos e ir para o trabalho, escolheriam ficar com seus filhos.
Mas isto implica em limitações financeiras, falta de recurso para eles próprios.
Comove porque estas mães poderiam deixar tudo perecer, mas batalham, acordam, arrumam e saem com seus bebês no frio, “pra batalha”.
Questiona porque...
Onde estão os pais dessas crianças?
Estão no trabalho? Mas ainda é tão cedo...
Talvez trabalhem à noite. Existem razões para isto...Elas não me pertencem, eu sei.
Estão dormindo?Ora, então, porque é que não ficaram com a criança ou não a levaram mais tarde à creche?
Eu sei, estas razões não me pertencem, eu corro risco de ser imparcial, eu que sou mãe trabalhadora também.
Posso julgar o que não me pertence. E não contribuir de nenhuma forma para melhoria.Um julgamento completamente inválido, sem sentido.
Porquê?
Ou será que não amam esses bebês que saem para a creche?
Quem sou eu para medir o amor dos outros?...Nem o meu é mensurável.
Eu tenho dó!
Porque a família é tudo. Os filhos da gente são tudo. E de onde eles saem? Das mães!
Eles custam caro, é verdade. Só que se não houver de onde tirar esse “caro” com dignidade e clareza a gente resolve tudo. Com a ajuda de Deus, é claro.
E muitas vezes dignidade é termo obscuro e clareza é treva na educação que recebemos- ou que deixamos de receber.
Não estou querendo culpar ninguém, apenas concluir que é possível ser digno- ou honesto se preferirem- se admitirmos a necessidade dessa característica na nossa vida. A necessidade da característica dignidade!
E pra admitir isso, somente se estiver claro, bem explicado. Por isso toquei no assunto clareza.
Volto ao início, que me faz refletir:os filhos saem de dentro de nós!
Antes de nascerem, são com a mãe uma unidade apenas. Um em decimal. Um elemento apenas.
E se bipartem no ato do nascimento, em dois seres distintos e indissociáveis ao mesmo tempo!

E se bipartem no ato da mãe dizer “tchau” na creche. E permanecem indissociáveis, ao longo do dia, até o reencontro, ao anoitecer, na volta do trabalho da mãe.

Os bebês gauchitos que saem de manhã no colo de suas mães pedestres amam igualmente seus pais.
Eu só queria saber onde eles estão neste momento histórico em que os fatos e os números comprovam que precisa-se de pais presentes.
E que os psicólogos alertam que é impossível ser mãe e pai ao mesmo tempo. Que ser mãe apenas já será uma grande coisa, porque muitas não o tem sido.
Você lembra do nosso pacto Paola?
Sim, você lembra. A gente se acerta desde a barriga.(Desde quando ela morava na minha barriga eu quero dizer...)
Lembra que eu te falava “quando chegar na hora, tu ajuda a mamãe, faz o teu melhor na hora de sair que a mãe vai fazer o melhor que puder pra não precisar ser de cesárea...”
E a gente foi bem!
Você me ajudou muito.
Eu tenho muita fé na tua lealdade. Você me trouxe paz quando eu estava desolada.

Eu nunca havia precisado de cuidados tão específicos, nunca fiquei tão fraquinha como depois daquele parto. Daí eu precisei aprender a ser humilde e pedir “por favor” para as pessoas, num momento em que eu realmente precisava de favor, e não por mera educação.
E pedir favor por precisar e não por educação, faz toda a diferença.
E em meio à minha debilidade, tua existência tranqüila, se alimentando de mim, e apenas de mim, me trouxe alento.
O alento de que me pertencias.
E eu a ti.
Tu és uma batalhadorinha. Dentro da barriga já realizavas tarefas comigo. Eu te contava o que estava fazendo.
Íamos à Igreja, fomos ao Campori Jovem em Forqueta “Ponto In Comum”.Eu cantava e morria de chorar de emoção “Toque minhas mãos”: /Levanto as mãos/em oração/pra alcançar Teu trono Pai/Toque minhas mãos/Posso imaginar o Deus de toda Glória/Vindo me abraçar/.
No banho, eu cantava “I can only Imagine” do Mercy Me e “We will Stand” do Acappela...
Para encontrar calma eu cantava “Oh! Nunca Separar!” do hinário Adventista e “Infinita Graça”.
Para falar com Deus, eu cantava “Na oração encontro calma/Na oração encontro paz...” e fechando meus olhos eu imaginava que eram 5 horas da manhã, no pátio da Igreja do Unasp, quando eu ia aos domingos no Culto da Fé, e orava de olhos abertos olhando as estrelas.
Era minha forma de te transmitir paz.

Arrumamos um trabalho na área de desenho, e você me ajudou a ser tão produtiva e correta, que mesmo tendo cometido a gafe de não contar que estava grávida, eles me absolveram por causa dos bons resultados que eu havia praticado.
E eu fiquei muitas noites sozinha.
Eu olhava tua prateleira de brinquedos e me perguntava, quando é que tu iria finalmente estar comigo mas sem estar em mim!...(risos)
Tu bem pequeninha!
Quando chegou, vermelhinha...
O rosto inchadinho, parecia um “achôlo”...(Pra quem não sabe o que significa, quer dizer cachorro em linguagem de bebês)
Você é muito inteligente, não adianta querer fugir. Eu li o Mundo de Sofia enquanto te esperava, eu já te contei a história. Eu li a Bíblia. Li “Educação”, de Ellen White. Eu li bons livros enquanto te esperei. Li sobre saúde e medicina natural. Estudei Auto Cad. E logo que você nasceu, passei no ENEM com nota suficiente pra me fazer bolsista na faculdade. E em nossos tempos, gente da nossa classe social, ou paga a faculdade, ou come. Ou veste. Ou vira bandido se não quiser fazer nenhuma destas atividades que citei, e toma o que é alheio. E depois vai pro inferno, não conhece Deus pessoalmente. Não tem razão de ser.
Então a última opção não vale a pena.
Porque não “fecha” com os nossos valores.
É por isso que a gente está pagando esse preço alto de ficar tão pouco tempo juntas. Até a mamãe se formar.
Depois disso, a gente vai aproveitar bem mais , vamos passear, construir os nossos sonhos. Porque sonhados eles já são.Só precisam de construção.
E é isso que nos faz continuar filha.
A certeza de nossos sonhos e a peleia que travamos por eles.
Uma peleia que somente princesas guerreiras podem lutar...

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